A endometriose é uma condição inflamatória crônica que afeta milhões de mulheres em idade reprodutiva e é caracterizada pela presença de tecido semelhante ao endométrio fora do útero.
Embora a dor pélvica intensa seja seu sintoma mais conhecido, os impactos emocionais da doença são igualmente relevantes. Viver com dor constante, passar por atrasos e incertezas no diagnóstico e enfrentar limitações na vida diária afeta profundamente a saúde mental, podendo desencadear ansiedade, depressão e queda significativa na qualidade de vida.
Compreender essa relação é fundamental, pois tratar apenas os sintomas físicos não é suficiente para garantir bem-estar integral.
O impacto da dor crônica na saúde emocional
A dor é a principal marca da endometriose, que leva muitas mulheres a conviverem com cólicas incapacitantes, dor durante a relação sexual, dor pélvica contínua e incômodos ao evacuar.
Essa dor persistente interfere na rotina e produz efeitos emocionais que se acumulam ao longo do tempo.
A convivência constante com a dor frequentemente resulta em:
Medo da dor: antecipação de crises durante o ciclo menstrual, atividade sexual ou esforço físico
Evitação: interrupção de atividades sociais, queda no rendimento profissional e dificuldade de manter rotina ativa
Isolamento: retração social gradual que aumenta a sensação de solidão
Desesperança: percepção de que nada melhora e de que a dor domina a vida
Estudos mostram que mulheres com endometriose apresentam risco significativamente maior de desenvolver ansiedade e depressão, o que demonstra a importância de um olhar diferenciado sobre a doença.
Ansiedade: um sintoma comum e frequentemente ignorado
A ansiedade não é apenas uma consequência emocional, mas parte do cotidiano de muitas pacientes com endometriose. Ela pode surgir de várias formas e se intensificar com o tempo.
Ansiedade antecipatória: O receio de passar por novas crises de dor gera tensão constante. A expectativa da dor desencadeia preocupação intensa, dificuldade de relaxamento e sintomas físicos como insônia e agitação
Ansiedade relacionada ao diagnóstico: O diagnóstico da endometriose geralmente é tardio, e muitas mulheres passam anos consultando diversos profissionais sem respostas claras. Essa incerteza afeta diretamente a saúde emocional e produz sensação de desamparo
Ansiedade ligada à fertilidade: Ainda que nem todas as mulheres com endometriose sejam inférteis, o medo de não conseguir engravidar pesa emocionalmente
Ansiedade no relacionamento: A dor durante a relação sexual comumente gera receio de intimidade e dificuldades de comunicação entre o casal, podendo reforçar sentimentos de culpa ou inadequação
Depressão: quando o desgaste emocional se soma à dor física
A depressão não é apenas tristeza, e quando está associada à endometriose, ela se soma a fatores como dor persistente, frustração, perda de autonomia e falta de compreensão por outras pessoas.
Alguns fatores que favorecem o desenvolvimento da depressão incluem:
Sensação de impotência diante da dor
Cansaço constante e exaustão emocional
Redução da produtividade no trabalho
Falta de validação do sofrimento
Dificuldades na vida sexual
Afastamento social
Com o tempo, muitas mulheres relatam perda de interesse por atividades antes prazerosas, alterações do sono, irritabilidade e sentimento de vazio.
Além disso, dor e depressão se influenciam mutuamente, já que quanto maior a dor, maior o risco de depressão e, quanto pior o estado emocional, mais intensa se torna a percepção da dor.
Qualidade de vida: mais do que um conceito, uma necessidade
A endometriose afeta a forma como a mulher vive, se relaciona e se percebe. Não é apenas um problema físico, mas sim um fator que atinge diferentes esferas da vida:
Vida profissional: Crises de dor, fadiga e desconforto dificultam a produtividade. Muitas mulheres precisam faltar ao trabalho ou não conseguem manter ritmo constante, o que impacta diretamente na carreira
Vida social: Sair de casa, participar de eventos ou planejar viagens se torna difícil diante da imprevisibilidade da dor. Isso reduz o convívio social e contribui para o sentimento de isolamento
Autoimagem: Sintomas como inchaço abdominal, alterações de humor e fadiga afetam a forma como a mulher percebe o próprio corpo, o que torna frequente sensações de inadequação e a insegurança emocional
Relacionamentos afetivos: A dor durante a relação sexual, a dificuldade de comunicação e a sensação de não ser compreendida prejudicam vínculos afetivos e criam barreiras emocionais que aumentam o sofrimento
Tratamento com foco integral
O manejo ideal da endometriose envolve um conjunto de cuidados que inclui ginecologia, fisioterapia pélvica, nutrição e acompanhamento psicológico.
E, sendo uma doença que afeta diferentes aspectos da vida diária, a saúde mental deve ser vista como parte essencial do tratamento.
1. Psicoterapia
Conversar com um profissional especializado ajuda a desenvolver estratégias de enfrentamento, novas formas de encarar situações difíceis e a lidar com a sensação de desamparo.
Existem diferentes tipos de abordagem, incluindo a terapia cognitivo-comportamental, junguiana e a psicanálise, entre outras. Cada pessoa pode se ajustar melhor a abordagens específicas, não existindo uma “mais recomendada”.
2. Grupos de apoio
Compartilhar experiências com outras mulheres que enfrentam a mesma condição reduz o isolamento, oferece acolhimento e fortalece a sensação de pertencimento.
Nem sempre é possível encontrar grupos presenciais desse tipo, mas é possível se conectar de forma online com outras pessoas que sofrem do mesmo problema.
3. Técnicas de relaxamento e terapias complementares
Questões crônicas de saúde muitas vezes necessitam de diferentes formas de manejo. Por isso, associar tratamentos médicos com exercícios e técnicas alternativas pode ser uma boa opção para melhorar a qualidade de vida:
Acupuntura
Meditação
Exercícios de respiração
Yoga
Essas práticas auxiliam na redução da tensão associada à dor e no relaxamento. No entanto, elas não são substitutas para os tratamentos convencionais da endometriose, como terapias hormonais e, em alguns casos, cirurgia.
4. Acompanhamento psiquiátrico
Em casos específicos, o uso de medicamentos para ansiedade ou depressão pode ser necessário, principalmente quando outras alternativas não surtiram efeito, ou quando os sintomas são intensos.
O objetivo é melhorar o bem–estar emocional e melhorar a capacidade de enfrentar a doença, uma vez que a endometriose é um distúrbio crônico de saúde.
O papel fundamental da validação e da informação
Muitas mulheres com endometriose relatam não serem levadas a sério quando descrevem sua dor.
Comentários como “é apenas cólica” ou “isso é normal” agravam o sofrimento e dificultam o diagnóstico e a busca por tratamento.
Assim, escutar o relato da paciente, oferecer informação correta e encaminhar para especialistas são ações que transformam a experiência de quem convive com a doença.
Dúvidas comuns sobre o tema
Sim. A depressão é relativamente comum na endometriose porque a doença envolve dor persistente, frustrações com o diagnóstico, impacto na vida sexual e dificuldade de manter atividades diárias. Esses fatores juntos podem gerar tristeza profunda, perda de interesse, cansaço extremo e sensação de impotência diante da doença.
Sim. A endometriose pode gerar ansiedade devido à dor contínua, ao medo de novas crises, às dificuldades no diagnóstico e às incertezas sobre fertilidade e tratamento. Essa soma de fatores cria tensão constante, preocupação excessiva e sensação de falta de controle, afetando diretamente o bem-estar emocional.
A dor crônica desgasta física e emocionalmente. Ela interfere na rotina, limita atividades, reduz produtividade e provoca isolamento. Com o tempo, isso aumenta a vulnerabilidade a ansiedade e depressão, já que viver em alerta contínuo causa estresse intenso e prejudica o equilíbrio emocional da paciente.
Referências ▼
- Interação em Psicologia – Depressão e Ansiedade em Mulheres com Endometriose: Uma Revisão Crítica da Literatura
- Physis: Revista de Saúde Coletiva – Quando os olhos não veem o que as mulheres sentem: a dor nas narrativas de mulheres com endometriose
- Revista Dor – Abordagem não farmacológica da dor em endometriose
